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Padrões IFRS S1 e IFRS S2: o mínimo que advogados e profissionais de sustentabilidade precisam saber


Padrões IFRS para Sustentabilidade - ESG

Luciana Vianna Pereira


O mês de junho nos brindou com os novos padrões para relatórios de sustentabilidade que trazem a promessa de consolidação do tema e de se tornarem os principais padrões versando sobre o tema do mundo.


Os Padrões IFRS S1 e IFRS S2 foram desenvolvidos pela ISSB (International Sustainability Standards Board), braço de sustentabilidade na IFRS (International Financial Reporting Standards) e entidade irmã da já antiga e bem conhecida IASB (International Accounting Standards Board.


Voltando um pouco na história, a ISSB surgiu ainda em 2021 com o objetivo de criar um padrão que pudesse ser usado globalmente, uma demanda que já existia há muito tempo no mercado ESG, especialmente por investidores, gestores de fundos e as próprias companhias reportantes, pela necessidade de se promover a comparabilidade entre relatórios de diferentes empresas e em diferentes países, o que só é possível através de padrões e metodologias unificados.


A IFRS é a organização internacional responsável pelos padrões contábeis mais amplamente aceitos globalmente e sua força na iniciativa de criação da ISSB foi rapidamente provada, pelas diversas declarações de apoio apresentadas pelos diretores das principais associações globais sobre o tema, como GRI - Global Reporting Standards, CDB – Carbon Disclosure Project, TCFD – Taskforce on Climate-related Financial Disclosures, TNFD - Taskforce on Nature-related Financial Disclosures, além da incorporação, em meados de 2022, de duas associações internacionais gigantes no mercado de padrões de sustentabilidade: a Climate Disclosure Standards Board (CDSB) e a Value Reporting Foundation (VRF), que já abrigava os amplamente conhecidos e usados padrões SASB.


A iniciativa recebeu ainda o apoio da IOSCO – International Organization of Securities Commissions, o Financial Stability Board, o G20 e dos líderes do G7.


No início de 2022, a IFRS lançou minutas do que seriam o IFRS S1 – General Requirements for Disclosure of Sustainability-related Financial Information e o IFRS S2 – Climate-related Disclosures, buscando a padronização das divulgações de informações relativas aos impactos climáticos e impactos de sustentabilidade.


Em junho de 2023, após uma extensa consulta pública e após a revisão de centenas de comentários recebidos do mercado, foram lançados o IFRS S1 e o IFRS S2 formando um arcabouço bastante relevante quanto aos relatórios ESG ou relatórios de sustentabilidade.


| Integração Sustentabilidade - Contabilidade


A integração entre a contabilidade e a sustentabilidade está na origem dos novos padrões. Os relatórios de sustentabilidade, elaborados conforme o IFRS S1 e o IFRS S2, deverão necessariamente seguir o arcabouço conceitual aplicável aos padrões contábeis IASB, já aceitos e reconhecidos pela legislação da maioria dos países do mundo, e a intenção é que a divulgação de informações de sustentabilidade seja compatível e atenda às necessidades dos mesmos destinatários das demonstrações financeiras.


| Foco nos impactos da sustentabilidade sobre as finanças


O IFRS S1 e IFRS S2 se destinam a empresas com fins lucrativos, que deverão divulgar informações sobre os seus riscos e oportunidades de sustentabilidade que sejam consideradas úteis aos usuários primários de demonstrações financeiras, em sua decisão de prover ou não recursos para a empresa. Ou seja, os reportes conforme o IFRS devem conter informações que razoavelmente possam impactar o fluxo de caixa da empresa, seu acesso a financiamento ou custo de capital, no curto, médio e longo prazos. As informações apresentadas devem ser completas, neutras e corretas.


O foco dos padrões IFRS se voltam claramente para dentro da empresa e devem permitir ao investidor avaliar os efeitos dos riscos e oportunidades relacionados à sustentabilidade sobre a posição financeira, performance e fluxo de caixa da empresa, no período avaliado, bem como a forma como a projeção dos riscos e oportunidades em sustentabilidade afetarão esses três elementos, conforme o planejamento financeiro da empresa.


As informações a serem divulgadas devem ser quantitativas e qualitativas. Do ponto de vista quantitativo, deverão incluir informações sobre como os riscos e oportunidades de sustentabilidade poderão demandar ajuste material para o ano fiscal seguinte, como a posição financeira da empresa pode ser alterada em decorrência de um risco ou oportunidade de sustentabilidade no curto, médio e longo prazos, as projeções de investimento e disponibilidade financeiras, formas de financiamento para implantação das estratégias relacionadas ao tema.


Os relatórios de sustentabilidade elaborados conforme os padrões IFRS S1 serão considerados adequadamente apresentados se divulgarem as informações relevantes acerca dos riscos e oportunidades de sustentabilidade que possam razoavelmente impactar os resultados da empresa e se seguirem os princípios de comparabilidade, verificabilidade, tempestividade e compreensibilidade.


Um outro ponto bastante importante do IFRS S1 é que ele absorve diretamente os padrões SASB de sustentabilidade, requerendo que as empresas façam referência e considerem a aplicabilidade dos tópicos por indústria e setor empresarial SASB, na avaliação de materialidade e elaboração de seus relatórios de sustentabilidade. No mesmo sentido, a IFRS S1 integra os questionários de recursos hídricos e biodiversidade do CDSB.


A IFRS assim, aproveita e integra os padrões SASB e os questionários da CDSB para as definições de materialidade de temas a serem avaliados por cada empresa em cada setor já mapeado, apesar de permitir às empresas avaliar dentro dos tópicos de divulgação da SASB e dos questionários CDSB quais são efetivamente materiais.


A definição de materialidade aprovada pelo IFRS S1 é a da informação que se omitida, má divulgada ou obscurecida, tem a faculdade de possivelmente influenciar razoavelmente a decisão dos usuários de tal informação em sua decisão de, embasados no relatório divulgado pela empresa: (a) comprar, vender ou manter participação societária ou papéis de dívida da empresa; (b) emprestar ou conceder crédito para a empresa; (c) exercer direito de voto, ou de outra forma, influenciar ações da administração da empresa que afetem o uso de recursos econômicos da empresa.


| Interoperabilidade com GRI e o Padrão Europeu


Ademais, na ausência de padrão IFRS para um tópico específico, a empresa poderá recorrer também a outros padrões como o GRI e o European Sustainability Reporting Standard – ESRS na sua decisão pode identificar uma informação que seja relevante para a tomada de decisão do usuário e que tenha representado ou represente uma oportunidade ou risco de sustentabilidade.


De outro lado, o IFRS S2 complementa o IFRS S1, especificamente no que diz respeitos aos riscos e oportunidades climáticos e, se uma empresa determinar que riscos e oportunidades climáticos podem razoavelmente afetar os resultados financeiros da empresa, ela é solicitada a aplicar o IFRS S2 ao preparar suas divulgações sobre tais riscos e oportunidades.


No caso do IFRS S2, a IFRS não aproveitou ou referiu para padrões por indústria existentes, mas optou por criar padrões e métricas por indústria, especificamente para os riscos climáticos físicos e de transição. São 68 indústrias contempladas, divididas em 11 setores econômicos, dentre eles, o setor financeiro, com volumes específicos para gestores de fundos e custodiantes, bancos, seguradoras, bancos de investimento e corretoras e financeiras. Os guias por indústria derivam dos Padrões SASB e contemplam parâmetros para auxiliar as empresas a identificar riscos e oportunidades quando aplicando o IFRS S2. Eles estão alinhados com os Guias da TCFD sobre métricas, objetivos e planos de transição.


Ademais, o IFRS S2 também segue e inclui definições sobre reporte sobre Escopo 1, Escopo 2 e Escopo 3, para emissões de gases de efeito estufa, seguindo a nomenclatura e os preceitos de reporte do Protocolo GHG, que, aliás, deve ser o guia dos reportes para inventário de emissões conforme o IFRS S2. Contudo, o IFRS S2, acrescenta alguns requisitos aos inventários de emissões, como categorias que uma empresa deve adotar quando da medição de emissões do Escopo 3 e inputs a serem usados para tais medições.


Os Padrões IFRS requerem o reporte de informações sobre governança, estratégia, gestão de riscos e métricas e objetivos, bem como as conexões entre estes elementos e entre eles e as informações constantes nas demonstrações financeiras.


Individualmente, (i) quanto a governança, as divulgações devem contemplar os processos, controles e procedimentos de governança a empresa adota para monitorar e gerir os riscos e oportunidades de sustentabilidade da empresa; (ii) quanto à estratégia, deve ser informada a abordagem da empresa para gestão dos riscos e oportunidades de sustentabilidade; (iii) quanto a gestão de riscos, os processos que a empresa usa para identificar, avaliar, priorizar e monitorar os riscos e oportunidades de sustentabilidade, no curto, médio e longo prazos e a avaliação de probabilidade de tais riscos e oportunidades afetarem o resultado financeiro da empresa; e (iv) quanto a métricas e objetivos, deve-se inserir a performance da empresa com relação aos riscos e oportunidades de sustentabilidade, incluindo o progresso com relação aos objetivos definidos pela empresa ou que ela deva atingir por força de obrigação legal ou regulatória.


| Para além dos impactos diretos, a cadeia de valor


Destaca-se ainda que, seguindo as tendências de mercado, o reporte não deve abranger somente os riscos diretos da atividade desempenhada pela empresa, mas também os riscos relacionados à sua cadeia de valor. No caso do IFRS S2, o reporte deve abranger os riscos climáticos físicos e também os riscos climáticos de transição, ou seja, aqueles necessários para adequação a novas leis, políticas, tecnologias e mudanças de mercado visando uma economia de baixo carbono, e incluir os riscos diretos decorrentes da atividade (Escopo 1), relacionados ao fornecimento de energia (Escopo 2) e da cadeia de valor (Escopo 3).


Com relação ao modelo de negócios e cadeia de valor, as empresas deverão mapear e divulgar onde os riscos e oportunidades relacionados a sustentabilidade se concentram no modelo de negócios e na cadeia de valor, com relação à área geográfica, tipos de ativos, unidades da empresa, etc.


| Pela primeira vez, os trade-offs


Outro ponto interessante é a previsão de que as empresas informem as compensações (trade-offs) entre riscos e oportunidades relacionadas à sustentabilidade, com relação à estratégia e forma de tomada de decisão. Assim, as empresas são chamadas a informar quais pontos geradores de risco e oportunidade foram considerados na expansão da atividade econômica para uma determinada localidade, por exemplo, e como foi a tomada de decisão e as compensações entre os riscos e oportunidades mapeados. Informações que, no Brasil, ficariam tipicamente adstritas a um EIA/RIMA ou estudo ambiental, passam a integrar os relatórios financeiros de sustentabilidade das empresas.


É importante destacar que os Padrões IFRS não exigem a elaboração de um relatório separado, indicando que as informações poderiam integrar os comentários da administração às demonstrações financeiras, integrando-as, quando a empresa assim preferir. Aliás, há expressa obrigação de que as divulgações de sustentabilidade financeiramente relevantes sejam simultâneas e contemplem o mesmo período de reporte das demonstrações financeiras.


| E quando serão obrigatórios?


Por fim, que em que pese os padrões IASB serem aceitos em mais de 140 países, a vinculação e obrigatoriedade de uso dos padrões IFRS de sustentabilidade por tais países não é automática. E, nesse sentido, a IFRS declarou que agora iniciará uma fase de negociação com os países, organismos internacionais e empresas para adoção dos padrões de sustentabilidade.


No Brasil, o Conselho Federal de Contabilidade criou um grupo de acompanhamento do ISSB e vem trabalhando na internalização dos padrões, observando as particularidades da legislação brasileira e deve se manifestar sobre a inclusão dos padrões IFRS em terras brasileiras.


Apresentamos acima, alguns dos principais pontos relacionados aos Padrões IFRS S1 e IFRS S2. De toda forma, é importante acompanhar a implementação dos padrões ao longo dos próximos anos, especialmente considerando que o reporte, a divulgação e a transparência de informações e o foco no investidor, acionista e financiador são a essência do que é o ESG.


Será bastante interessante também acompanhar o movimento da Europa e Estados Unidos sobre o tema.

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